sexta-feira, agosto 11, 2006

Anticapitalismo na Música


Entrei num daqueles micro-ônibus, aqui em São Paulo chamados de "lotações". Eis que minutos após eu me sentar, tinha um rádio ligado, e tocava uma música antiga do Cazuza, "A burguesia fede".
Há quantos anos eu não ouvia isso! Sempre cantei essa música com aquela convicção de que estava proclamando verdades que a sociedade não queria ouvir, me sentia "o" revolucionário, "o" culto, cantando uma mensagem de liberdade, denúncia do egoísmo e solidariedade aos necessitados...

Como era mesmo o ditado? "Se você não é socialista quando jovem, é porque não tem coração. Se continua a ser socialista quando adulto, é porque não tem cérebro". Frase ácida, mas hoje eu concordo.

Continuando, comecei a prestar atenção na letra da música: "A burguesia fede, a burguesia quer ficar rica; enquanto houver burguesia não vai haver poesia".
Humm... me veio à cabeça a imagem do mecenas no início do Renascimento. O que era um mecenas senão um burguês? E não eram justamente eles que patrocinavam os pintores, escultores e poetas? Todos esses artistas morreriam de fome se não fossem por seus mecenas, seus patrocinadores burgueses, pois somente de 1900 pra cá que existe um "mercado da arte", capaz de prover sustento aos artistas que não tem outra ocupação. Quantos Van Goghs não morreram na miséria?
Opa!! Perceberam na oração acima? Hahahaha... nem eu percebi no primeiro momento. Justamente o demônio-mercado é que permite que os artistas vivam da sua arte, sendo que antes quem os patrocinava eram os... burgueses!! Oh Ironia, de olhar oblíquo qual uma Capitu...

"Pobre de mim que vim do seio da burguesia, sou rico mas não sou mesquinho".
Uau! Cazuza está dizendo que apesar de ser rico, ele, em específico, não é mesquinho. Qual é o pensamento implícito nessa afirmação? Que os ricos são todos maus e os pobres são todos bonzinhos. Para Cazuza não existe essa história de educação, moral e livre-arbítrio. Se o sujeito é rico ele é "do mal" e pronto! É claro que ele não disse isso textualmente, mas é a única coisa que dá pra concluir de uma frase lastimando o fato de ter nascido filho de burgueses!

"A burguesia não repara na dor da vendedora de chicletes"
Quero te perguntar uma coisa, leitor: você repara na dor dela? Seus amigos reparam? E no mendigo, no morador de rua, você repara? Seus pais, professores, colegas de trabalho reparam?
Por que raios é só a burguesia que tem de reparar no sofrimento dos outros, mesmo que não tenha sido causado por ela?
Sabe qual é o pensamento implícito? Eles têm de se importar porque são ricos. O pensamento mais nefasto, mais anticapitalista e intelectualmente desonesto é que os ricos causam a pobreza dos outros apenas por serem ricos. Enquanto essa idéia for propagada nas escolas, revistas e vomitada pelos nossos "intelectuais", o Brasil não corre o menor risco de dar certo.

Não se trata de deixar as pessoas sofrerem, de não ajudar quem precisa. Quem puder ajudar, que ajude sim. O problema é jogar a responsabilidade só nas costas da "burguesia". Não são todos iguais perante a lei?

"Vamos pôr a burguesia na cadeia; Numa fazenda de trabalhos forçados; Eu sou burguês, mas eu sou artista; Estou do lado do povo, do povo".
Vamos pôr o burguês na cadeia... apenas porque ele é burguês? Isso é que é um defensor da liberdade! E em seguida... fazenda de trabalhos forçados!!! Calma, Cazuza. Hitler e Stálin já fizeram isso antes de você.
E o corolário é que ele está do lado do povo porque é artista!! Posso me eximir de comentar essa?

"Porcos num chiqueiro; São mais dignos que um burguês; Mas também existe o bom burguês
Que vive do seu trabalho honestamente"

Ahh... agora está tudo bem!! Xinga a burguesia de tudo quanto é nome na música inteira, no refrão, e depois em quatro versos quer se justificar? Pena que ninguém disse ao Cazuza que o burguês que vive do seu trabalho honestamente é justamente a maioria.

E maioria dos "burgueses" é honesta, pelo mesmo motivo que a maioria dos pobres também é honesta! Pensem nisso, e pensem no motivo.

1 Comments:

At 15:34, Anonymous Anônimo disse...

Porque voce abandonou o blog? Excelente trabalho o seu! Lastimável!

 

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